Sobre separações cromatográficas por CCD – I – solventes e eluentes

Químicos de produtos naturais trabalham durante boa parte do tempo otimizando e realizando separações cromatográficas. Porém, muitas vezes investimos um tempo considerável separando e re-separando misturas, as quais poderiam ser resolvidas levando-se em consideração alguns princípios básicos de cromatografia, como:

a) a qualidade dos solventes utilizados;

b) a qualidade das fases estacionárias utilizadas;

c) a seletividade dos solventes utilizados para preparar um eluente;

d) a seletividade da fase estacionária a ser utilizada.

Sobre solventes, podemos verificar que existem vários aspectos. O primeiro é o grau de pureza necessário, de acordo com a separação que se deseja. Obviamente, solventes a serem utilizados em cromatografia líquida de alto desempenho (HPLC) devem ter um grau de pureza muito maior do que solventes a serem utilizados na primeira separação cromatográfica de um extrato bruto. Mesmo assim, o teor de água em solventes polares influencia fortemente na qualidade de uma separação cromatográfica preliminar. Portanto, é desejável que solventes como metanol (MeOH), etanol (EtOH), acetona e até mesmo acetato de etila tenham um baixo teor de água. Para tanto, muitas vezes é necessário secar e destilar os solventes. Se tal procedimento for viável, a literatura (Perrin e Amarego, “Purification of Laboratory Chemicals”, Pergamon Press, 3a edição, 1988) recomenda:

MeOH e EtOH – simplesmente uma destilação cuidadosa pode diminuir o teor de água até 0,01%.

isopropanol (i-PrOH) – normalmente pouco utilizado em cromatografia de coluna (CC), i-PrOH é bastante utilizado em separações por HPLC, e não necessita de purificação se adquirido com grau de pureza cromatográfico.

acetona – pode ter quantidades variáveis de i-PrOH e água. Um bom procedimento é adicionar permanganato de potássio (KMnO4) suficiente para que a coloração roxa persista e simplesmente destilar a mistura. Se muito impura, a “cauda” da destilação se tornará apreciavelmente marrom devido à formação de MnO2.

Solventes apolares apresentam impurezas tais como ftalatos e estabilizantes (no caso de solventes clorados). Para estes, o procedimento de purificação é distinto:

hexano – pode conter quantidades apreciáveis de ftalatos e hidrocarbonetos aromáticos. Para se obter hexano de boa qualidade, idealmente deve ser tratado com uma pequena proporção (cerca de 1 – 5% do volume a ser purificado) de ácido sulfúrico concentrado (H2SO4) de maneira a promover a sulfonação dos hidrocarbonetos aromáticos. Após separação do H2SO4 em funil de separação, o hexano é lavado com uma solução saturada de bicarbonato de sódio (NaHCO3), depois com água, sêco com cloreto de cálcio (CaCl2) e destilado. Desta maneira se obtém hexano com muito bom grau de pureza.

diclorometano (CH2Cl2): deve ser tratado de maneira idêntica ao hexano.

clorofórmio (CHCl3) – deve ser lavado com água para eventual remoção de EtOH (estabilizante), secagem com CaCl2, destilação e armazenamento em frascos muito escuros, longe da luz. Clorofórmio reage lentamente com oxigênio e luz fornecendo fosgênio (Cl2C=O), cloro (Cl2) e cloreto de hidrogênio (HCl), contaminantes perigosos e que podem promover a degradação de compostos orgânicos suscetíveis a ácidos.

acetato de etila (AcOEt) – as principais impurezas são água, EtOH e ácido acético (AcOH). Pode ser purificado por lavagem com solução saturada de carbonato de sódio (Na2CO3), sêco com sulfato de cálcio (CaSO4) ou sulfato de magnésio (MgSO4) e destilado.

éter etílico (Et2O) – este solvente pode conter principalmente quantidades apreciáveis de EtOH e água, mas também peróxido de dietila (Et-O-O-Et) e aldeídos. A obtenção de Et2O de boa qualidade é trabalhosa. Um litro de Et2O deve ser agitado com uma solução de 110 mL de água contendo 6 g de sulfato ferroso (FeSO4) e 6 mL de H2SO4 concentrado. Após a separação das fases, o Et2O deve ser lavado com água, seco por 24 h com CaCl2 e destilado. O solvente purifiado deve ser guardado no escuro e utilizado no máximo em alguns dias.

Outros solventes que podem ser utilizados em misturas eluentes são: tolueno (metilbenzeno), tetraidrofurano (THF), dioxano, dimetilformamida (apenas para cromatografia em camada delgada, CCD), acetonitrila (MeCN), n-butanol. Estes podem ser adquiridos com bom grau de pureza (e são caros). No caso de THF e dioxano, estes devem ser também guardados no escuro, pois, tal como Et2O, podem formar peróxidos quando guardados por períodos prolongados.

Eluentes preparados com solventes de bom grau de pureza fornecem melhores separações cromatográficas.

Eluentes utilizados para cromatografia em modo normal (fase estacionária polar – fase móvel apolar) podem apresentar composições as mais variadas, dependendo da classe de compostos que se deseja separar. Estes variam desde lipídios (muito apolares) até aminoácidos (muito polares). Usualmente se utiliza cromatografia em modo normal para análises por cromatografia em camada delgada (CCD), que podem (e devem!) ser utilizadas para se escolher o eluente mais apropriado para separações por cromatografia em coluna (CC) em modo normal. Levando-se em conta que a fase estacionária de longe mais utilizada em CCD é sílica gel, boas misturas eluentes são (por ordem de polaridade):

misturas binárias:

  1. hexano-CH2Cl2

  2. hexano-AcOEt

  3. hexano-acetona

  4. hexano-isopropanol

  5. CH2Cl2-AcOEt

  6. CH2Cl2-acetona

  7. CH2Cl2-isopropanol

  8. CH2Cl2-MeOH

  9. CH2Cl2-THF

  10. CH2Cl2-MeCN

  11. AcOEt-MeOH

  12. tolueno-acetona

  13. tolueno-AcOEt

  14. acetona-H2O

  15. EtOH-hidróxido de amônio (NH4OH)

misturas ternárias:

  1. hexano- CH2Cl2-AcOEt

  2. CH2Cl2-AcOEt-MeOH

  3. CH2Cl2-MeOH-DMF

  4. CHCl3-MeOH-AcOH (poucas gotas deste último) – para substâncias com caráter ácido

  5. n-BuOH-AcOH-H2O – idem

  6. EtOAc/MeOH/NH4OH (poucas gotas deste último) – para substâncias de caráter alcalino

misturas quaternárias:

  1. hexano- CH2Cl2-AcOEt-MeOH

  2. hexano-isopropanol-AcOEt-MeOH

Vale a pena usar a imaginação, de maneira criteriosa. A bíblia sobre cromatografia em camada delgada ainda é o livro de Egon Stahl, “Thin Layer Chromatography”, Springer-Verlag, 1969. Não conheço outro melhor.